Diário de Curitiba

Minha opinião — que ninguém pediu — sobre a série Adolescência

Adolescência é a nova minissérie da Netflix – Divulgação/Netflix

Sempre insisto em dizer: o problema da infância e da adolescência no mundo são os adultos. A série Adolescência que ninguém pediu escancara isso — um bando de adultos irresponsáveis.

Como a maioria dos personagens é masculina, dá para dizer sem medo: trata-se de um bando de homens medíocres com poder para continuar sendo medíocres.

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A série começa com um pai policial ouvindo um áudio do filho e, deliberadamente, ignorando a mensagem. Ele comenta com a colega de trabalho que “espera que a mãe do menino não o deixe faltar na escola”. Um homem que espera que uma mulher faça por ele, uma demanda que chegou até ele.

Pai ausente-presente? Há de monte, e a série mostra vários assim, do início ao fim.

Quando o personagem Jamie pede que o pai o represente em uma situação importante, o pai não entende, se mostra perdido. Para ele, a figura que deveria estar ao lado do filho é, mais uma vez, a mãe — mesmo o pedido vindo diretamente do menino. Outro exemplo de figura paterna que foge à responsabilidade, esperando que a mulher ocupe o lugar que ele não quer assumir.

A fraqueza e fragilidade masculina retratada na série é também cognitiva. Personagens masculinos incapazes de elaborar frases completas sem parecerem confusos, desorientados. Isso não é acaso — é estratégia. Uma cultura de mediocridade masculina que se sustenta há séculos.

Homens dizem entre si: “Faça malfeito, que elas farão por você”. Estejam ou não em grupos masculinistas formais, essa lógica é reproduzida: a terceirização da responsabilidade, a perpetuação da incompetência funcional como identidade de gênero.

Enquanto isso, as figuras femininas na série são silenciadas, submissas — e, não raro, eliminadas.

No terceiro episódio, é angustiante assistir à cena em que a psicóloga é assediada por um guarda. Sim, aquilo é assédio. Comentários desnecessários, aproximação invasiva, risadinhas para disfarçar posturas abusivas. Aquilo não é charme. É intimidação.

O adolescente da série entra em fúria toda vez que se sente confrontado. E é justamente nesses acessos de raiva que ele se sente masculino. Já absorveu o ciclo da violência: bate, depois assopra. Grita, quebra objetos, confronta a psicóloga. Só para quando outro homem, mais velho, intervém. Aí, sim, pede desculpas. E, pasmem, um caputino.

Essa é a pedagogia da violência masculina: explode, pede perdão e se serve. Porque a violência, para ele, é linguagem. É modo de existir.

A conclusão do episódio é perturbadora. “Ela, aquela reta, exposta, não me quis e tirou sarro de mim”. O recado está dado. Meninas, mulheres: não recusem meninos. Não os contrariem. Não deem risada. Ou eles podem ficar bravos. E matar.

O último episódio é a pá de cal: homens que só conhecem a linguagem do silêncio ou da violência. E que não são retratados como péssimos pais — apenas como “homens sendo homens”.

A cena final, em que o adolescente faz uma confissão grave e o pai responde com um silêncio abissal, é o retrato perfeito daquilo que sempre tento dizer: o problema da adolescência não são os adolescentes. São os adultos despreparados.

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