Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, escreveu uma carta a Lula. E nela, impôs uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos EUA, a partir de 1º de agosto de 2025. O motivo? O Brasil, segundo ele, é protecionista, hostil, censura americanos e persegue Jair Bolsonaro. E isso precisa acabar.
O texto, publicado na Truth Social, fala em tom de ameaça: se o Brasil reagir com medidas semelhantes, o valor da tarifa sobe. Se quiser negociar, precisa “abrir seus mercados” e rever sua política interna. E se quiser evitar punições maiores, é melhor não tocar no ex-presidente Bolsonaro — a quem Trump classifica como “respeitado em todo o mundo” e vítima de “caça às bruxas”.
• Clique aqui agora e receba todas as principais notícias do Diário de Curitiba no seu WhatsApp!
Trump é o presidente dos EUA.
Bolsonaro é réu no Supremo Tribunal Federal.
E mora no Brasil.
Está inelegível até 2030 por duas decisões do TSE, e responde à acusação de tentativa de golpe de Estado. Pode pegar mais de 40 anos de prisão. E mesmo assim, é tratado por Trump como um símbolo — um mártir que deve ser salvo, nem que para isso o Brasil inteiro pague a conta.
E é exatamente isso que está acontecendo: o país está pagando a conta de uma aliança pessoal entre dois homens que transformaram a política em culto e a soberania em moeda de troca.
O mais chocante, porém, não está na carta. Está na resposta — ou na ausência dela.
No mesmo dia em que Trump impôs a tarifa mais alta anunciada até agora, a Comissão de Relações Exteriores da Câmara aprovou uma moção de louvor e regozijo a Donald Trump. Sim, louvor. Sim, regozijo. E com voto de bolsonaristas e aliados, alguns dos quais já lhe deram a maior honraria do Congresso brasileiro em 2024, mesmo sem ele colocar os pés em Brasília.
Trump ataca o STF, diz que nossas decisões são ilegais, ofende nossa balança comercial, distorce dados, ameaça sanções — e é aplaudido em plenário. Chamado de exemplo de democracia. Aclamado como “um dos melhores presidentes do mundo”.
O nome disso não é diplomacia.
É servilismo.
Na mesma sessão, o deputado Nikolas Ferreira tentou convencer que isso não fere a soberania nacional. E outros bolsonaristas agradeceram a Trump pelo gesto, dizendo que ele só está “defendendo a liberdade” — a liberdade, entenda-se, de proteger um aliado sob julgamento, mesmo que isso custe bilhões ao país.
É como se o Brasil tivesse se tornado refém da pauta de um estrangeiro — e sua ala política dominante, cúmplice do castigo.
Enquanto isso, Jair Bolsonaro — o homem no centro da carta — se diz perseguido, mas não comenta a tarifa. Ignora o impacto econômico, foca nas pesquisas eleitorais. E sua base nas redes continua tratando Trump como aliado, como se o Brasil fosse um projeto satélite da política americana.
Mas o impacto é real.
O setor exportador, especialmente do agronegócio, já calcula prejuízos.
A tarifa atinge diretamente produtores de leite, café, açúcar, carnes.
Muitos deles no interior de São Paulo, reduto político de Tarcísio de Freitas, que também não reagiu.
Até quando vamos tolerar esse tipo de chantagem com aplauso?
O presidente Lula, diferentemente do Congresso, respondeu.
Num comunicado firme, disse:
“O Brasil é um país soberano com instituições independentes que não aceitará ser tutelado por ninguém.”
E foi além:
“É falsa a informação sobre o alegado déficit norte-americano. As estatísticas do próprio governo dos EUA comprovam superávit de 410 bilhões de dólares em 15 anos.”
E concluiu:
“Qualquer elevação tarifária unilateral será respondida à luz da Lei de Reciprocidade Econômica.”
Ou seja, o Brasil respondeu.
O que falta é o Brasil ser ouvido — inclusive por quem ocupa cargo público por aqui.
Porque se de um lado temos um presidente que reage com altivez, do outro temos um vereador de Curitiba, Guilherme Kilter (NOVO), que viu na tarifa um motivo para convocar o impeachment de Lula e de Alexandre de Moraes. Escreveu isso:
“Trump anuncia 50% de taxa ao Brasil e converte todos os petistas pró-taxação em inimigos das taxas. Impeachment do Lula e Alexandre de Moraes JÁ!”
Talvez seja o exemplo mais puro do que esse texto tenta denunciar: há brasileiros que já desistiram de ser brasileiros.
Que pensam com passaporte estrangeiro, que aplaudem punição externa como se fosse justiça divina, que confundem Twitter com diplomacia e tarifa com fidelidade.
A carta de Trump não foi apenas um gesto político.
Foi um retrato do que somos — e de quem ainda se ajoelha quando a bandeira é gringa.
Patriotismo de verdade se mede no conflito, não na conveniência.
E nesses dias estranhos, é o Brasil que precisa ser defendido de seus patriotas.