A Câmara dos Deputados aprovou projeto que concede novo prazo de um ano para proprietários de arma de fogo pedirem o registro, devendo comprovar a posse lícita da mesma. O Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03) permitiu essa regularização apenas até 31 de dezembro de 2008.
A norma consta do Projeto de Lei 9433/17, do Senado, que disciplina a destinação de armas apreendidas a órgãos de segurança pública ou às Forças Armadas. Devido às mudanças feitas pelos deputados, o projeto retorna ao Senado para nova votação.
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O texto aprovado pelo Plenário nesta quarta-feira (11) é um substitutivo do relator, deputado Ismael Alexandrino (PSD-GO).
Segundo o texto, poderá ser regularizada qualquer arma em posse do interessado, mesmo antes da data prevista no Estatuto do Desarmamento. O possuidor ou proprietário da arma poderá pedir inclusive o registro provisório.
Como o texto retira a referência à Polícia Federal enquanto órgão registrador, isso abriria a possibilidade de regulamentar a competência de outro órgão federal para emitir o certificado provisório, como o Comando do Exército, que já autoriza a compra de arma de uso restrito por parte de militares e policiais.
Requisitos para compra
O substitutivo também muda requisitos para a compra de arma de fogo, limitando a alguns tipos de crimes a exigência de não estar respondendo a qualquer inquérito policial ou processo criminal.
A partir do texto de Alexandrino, poderão comprar arma de fogo e registrá-la em seu nome aqueles que estiverem respondendo a inquérito policial ou processo criminal, exceto por:
- crime doloso contra a vida;
- crime qualificado como hediondo ou a este equiparado;
- crime contra a dignidade sexual, tentado ou consumado;
- crime tipificado na Lei Maria da Penha;
- crime cometido contra o patrimônio com o uso de violência; ou
- crime de ameaça ou cometido com grave ameaça.
Assim, quem estiver respondendo por furto poderá comprar uma arma.
Por outro lado, o texto deixa mais claro que, além de continuar a ter de fornecer certidões negativas de antecedentes criminais, o interessado não poderá ter sido condenado por sentença com trânsito em julgado e não poderá estar sob restrição por medida protetiva, como a relacionada a violência doméstica (manter distância da vítima).
Outras condições exigidas em lei não são mudadas, como comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo.
Renovação
Quanto à periodicidade de renovação do certificado de registro de arma de fogo, o texto aprovado prevê o aumento de três para cinco anos. Contrariamente ao regulamento atual, o prazo para comprovar a manutenção dos requisitos contará a partir da emissão do certificado anterior.
O regulamento prevê que o processo de renovação deve começar antes do fim do prazo do certificado vigente a fim de não haver interrupção da autorização de posse.
Disparo em público
Quanto ao crime inafiançável de disparar arma de fogo em público, haverá uma exceção: se for para legítima defesa ou de outra pessoa.
Atualmente, o Estatuto do Desarmamento prevê reclusão de 2 a 4 anos para quem disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime.
Armas de uso restrito
Em artigo que remete ao Comando do Exército autorizar, excepcionalmente, a compra de armas de fogo de uso restrito, o substitutivo aprovado inclui nova exceção em que não se aplica a autorização, atualmente apenas dispensada para os comandos militares.
Assim, as instituições policiais federais e estaduais não precisarão dessa autorização.
Armas ligadas a processo
Segundo o Código de Processo Penal, coisas apreendidas não poderão ser restituídas enquanto interessarem ao processo.
Com o projeto aprovado, aquelas, inclusive armas, que tiverem sido objeto de exame pericial definitivo deverão ser restituídas ou ter a destinação definida em lei.
A fim de especificar situações em que a coisa não deverá ser mantida para o andamento do processo, o relator cita aquelas cuja conservação for impossível, custos ou desaconselhável (como armas de grosso calibre) ou armas apreendidas por contrabando ou descaminho e ainda as coisas sujeitas a pena de perdimento.
Destruição ou doação
O texto aprovado pela Câmara estipula outras regras sobre destinação de armas apreendidas, diferentes daquelas propostas pelo Senado, e cria uma lista de prioridades de órgãos destinatários.
O armazenamento em instalações do Poder Judiciário só poderá acontecer em casos excepcionais e desde que devidamente justificados pelo juiz. No geral, as armas devem ficar na delegacia policial ou nas dependências do órgão encarregado de realizar o exame pericial.
Após passar por perícia do Exército, as armas, acessórios e munições poderão ser doadas às Forças Armadas e aos órgãos de segurança pública segundo o padrão de uso de cada instituição, com preferência na seguinte ordem, exceto aquelas de uso proibido ou de uso restrito:
- órgãos de segurança pública do estado em que se deu a apreensão;
- órgão de segurança pública que tiver a menor relação de armas por integrante efetivo da instituição solicitante;
- órgão de segurança pública cuja sede se localize em área de maior criminalidade;
- guardas municipais; e
- Polícia Legislativa Federal.
Entretanto, a critério do Comando do Exército, armas de fogo, acessórios e munições fora do padrão de qualquer das instituições, mesmo aquelas de uso proibido ou de uso restrito, poderão ser doados com “razoável justificação”.
Sem número
No caso de arma de fogo apreendida sem número de série ou sem outros elementos de identificação, mas que estiver em perfeito estado de conservação e própria para uso, será renumerada pelo Comando do Exército, que providenciará novo registro para doação aos órgãos de segurança.
Boa-fé
Ficam de fora das regras de doação após apreensão, as armas apreendidas pertencentes ao ofendido ou a terceiro de boa-fé. Nesse caso, deverão ser restituídas ao legítimo proprietário em 30 dias depois da decisão judicial correspondente.
O relator do projeto, deputado Ismael Alexandrino, afirmou que um país com grandes dificuldades financeiras e de equilíbrio fiscal, como o Brasil, “não pode se dar ao luxo” de destruir armamento que pode ser empregado pelas forças de defesa e de segurança pública.
Alexandrino também defendeu a possibilidade de renovar o registro de armas. “Impossibilitar o registro não extinguirá a existência das armas, elas continuarão a existir, permanecendo na ilegalidade como ‘armas frias’, na clandestinidade, muitas vezes sendo usadas na criminalidade ou para ‘esquentar’ supostos conflitos”, disse.
Debate em Plenário
Durante a discussão do projeto em Plenário, a deputada Delegada Katarina (PSD-SE) defendeu o cadastro de armas recebidas de herança e de colecionadores. “Armas que estavam na clandestinidade passam a poder ser monitoradas”, explicou.
Já o deputado Pastor Henrique Vieira (Psol-RJ), vice-líder do governo, criticou o projeto por flexibilizar o Estatuto do Desarmamento. “Tem uma lista de crimes que, antes, uma pessoa com inquérito não poderia registrar. A partir de agora, poderá registrar”, disse.
Segundo ele, seu partido defende uma linha de controle rígido sobre armas e munições. “Entendemos que mais armas circulando é mais violência contra nosso povo.”
A deputada Lídice da Mata (PSB-BA) disse ser contra flexibilizar a legislação porque a proposta vai ampliar a mobilidade de armas na sociedade.