Por MERY ELLEN G G HIDALGO DE MATOS
A última semana foi marcada por um termo nas redes sociais devido ao reality show de uma das grandes emissoras do país: a cultura do cancelamento. O movimento hoje conhecido com esse nome começou, há alguns anos, como uma forma de chamar a atenção para causas como justiça social e preservação ambiental. Seria uma maneira de amplificar a voz de grupos oprimidos e forçar ações políticas de marcas ou figuras públicas.
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Não é de hoje que vivemos no dia a dia ações de pressão psicológica, discriminação pela raça, cor, credo, opção sexual. Quando se é adulto, temos forças para denunciar e tentar valer nossas escolhas, nossas situações. No entanto, o cancelamento, a discriminação são vividos diariamente pelas famílias de autistas, desde a escola escolhida para trilhar a educação, ao restaurante, ao cinema.
É inadmissível pensar que em pleno 2021, temos escolas particulares no Brasil negando matrícula a crianças de 04 anos, pelo fato da mesma ser autista. Enquanto a mídia escancara o rompimento do sonho de um artista, temos o início das aulas acontecendo no país, em plena pandemia, com negativas de matrículas. Uma realidade sofrida e pouco divulgada.
Na última semana nossa fundação I.G.U.A.I.S foi procurado por uma família para denunciar e buscar ajuda, pois o filho de apenas 04 anos, teve sua matrícula negada em uma escola adventista da Região Metropolitana de Curitiba, por ser autista e necessitar ainda do uso de fraldas. Meu filho, por exemplo, em 2019, foi convidado pelo colégio a se afastar das aulas, até que fosse emitido um laudo médico atestando que ele possuía plenas condições mentais de frequentar o ambiente escolar. Esquecem, essas pessoas, que as crianças precisam de apoio e mediação.
É esquecido, no entanto, que os colegas – também crianças – possuem exemplos de suas casas, dos programas de TV, da vida social. Os colegas provocam, fazem piadas, dão risadas, ridicularizam e quando a criança autista revida o problema é só ele. Que os professores despreparados não respeitam os limites e particularidades e desencadeiam as crises. Que marginalizam a criança dizendo que ele tem como alvo professoras mulheres e meninas. Que a professora é inadequada que além de eliciar uma crise no menino, ainda fez enfrentamento fazendo com que a crise fosse estendida em duração e intensidade. Foi atingida com um chute e se recusa a dar aula para a turma da criança. Isso é discriminação, e das mais graves existentes!! E a escola é conivente.
O artista Lucas Penteado não aguentou a pressão dentro de uma casa, de um programa. Pensem então, o que nós pais de crianças autistas passamos diariamente quando nossos filhos não são aceitos, são marginalizados e segregados. É exaustivo precisar lembrar todo dia, a todos que muitas crianças com autismo têm condições de acompanhar uma escola regular. Manter o autista na escola é uma tarefa desafiadora, mas temos amparo legal para isso. É importante lembrar que a Lei 12.764 de 27/12/2012 determinou no artigo 1º, § 2º “A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.”.
A lei é muito clara em conceder esse direito a pessoa com autismo, mas é necessário comprovação da necessidade.
Enquanto o respeito às diferenças não existir, enquanto a empatia for apenas uma palavra de rede social, teremos ainda no Brasil muitos Lucas sendo pressionados, aprisionados dentro de suas escolhas, dentro de seu mundo. E enquanto existir esse desrespeito, estaremos aqui, do outro lado, lutando com a bandeira que “ELE VAI PARA ESCOLA”, somos mais que um diagnóstico, temos o direito ao estudo, a vida.
MERY ELLEN G G HIDALGO DE MATOS, presidente da Fundação I.G.U.A.I.S, idealizadora do movimento #ELEVAIPARAESCOLA que promove a conscientização a respeito da inclusão social de crianças do espectro autistas nos colégios