Fiscalizações realizadas pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná desde o início da pandemia chegaram à mesma conclusão: apesar do subsídio oficial, o sistema de transporte coletivo de Curitiba não está conseguindo manter os limites de ocupação fixados legalmente para reduzir o contágio pela Covid-19.
Esse foi o principal motivo que levou o presidente do TCE-PR, conselheiro Fabio Camargo, a emitir medida cautelar restringindo a circulação de ônibus na capital, mas mantendo o transporte de trabalhadores da saúde e de serviços considerados essenciais pelo município.
• Clique aqui agora e receba todas as principais notícias do Diário de Curitiba no seu WhatsApp!
A pedido da Prefeitura de Curitiba, a liminar foi derrubada pelo Tribunal de Justiça do Paraná na noite da última sexta-feira (19 de março). Com base em relatório técnico, o TCE-PR, em conjunto com a Procuradoria-Geral do Estado, vai solicitar ao TJ-PR que reconsidere sua posição e permita a implantação efetiva da restrição de circulação do transporte coletivo, considerado um dos principais focos de disseminação do coronavírus.
“O argumento utilizado será a competência constitucional do Tribunal de Contas de emitir medidas cautelar em sua missão de fiscalizar o gasto público do ponto de vista operacional”, afirma o diretor jurídico, Gustavo von Bahten.
A cautelar foi emitida a partir de denúncia apresentada pelo Sindicato dos Motoristas e Cobradores nas Empresas de Transporte de Passageiros de Curitiba e Região Metropolitana (Sindimoc) e dos achados na fiscalização. A entidade apontou o aumento acelerado de mortes de trabalhadores do setor, chegando a 100, em decorrência da Covid-19.
Entre maio de 2020 e março deste ano, o cofre municipal repassou às empresas que operam o transporte em Curitiba um total de R$ 203.413.831,61. O repasse desse volume significativo de dinheiro público às prestadoras do serviço, no entanto, não foi suficiente para assegurar os parâmetros razoáveis de ocupação dos veículos estipulados no Regime Emergencial de Operação e Custeio do Transporte Coletivo, implantado pela Lei Municipal nº 15.627/2020.
Em maio do ano passado, o TCE-PR havia determinado a suspensão, em medida cautelar, dos repasses com base nessa lei. Aquela decisão também foi suspensa pelo Poder Judiciário.
Ônibus lotados
Desde o início da pandemia, o TCE-PR intensificou a fiscalização do transporte coletivo de Curitiba. Auditoria realizada por equipe técnica da Casa entre fevereiro e setembro de 2020 concluiu que, mesmo depois do agravamento da pandemia de Covid-19 e do início do pagamento de subsídios às empresas, os ônibus trafegavam lotados.
A lei nº 15.627/2020 estabelecia ocupação máxima de 50% da capacidade dos veículos. Decretos municipais editados posteriormente aumentaram esse limite para 70% e o percentual obrigatório só retornou aos 50% no último dia 12 de março, no iminente colapso da rede hospitalar da capital, por força do Decreto n° 520/21.
A situação de descumprimento do patamar máximo de ocupação dos ônibus foi confirmada em inspeção, realizada por nove auditores da Coordenadoria de Auditorias do TCE-PR, ao fim da tarde da última sexta-feira (19), no horário de pico do transporte. A fiscalização foi determinada pelo presidente, por meio da Portaria nº 462/21.
Os servidores conferiram o movimento nos seguintes locais: Estação Praça Eufrásio Correia, nos dois sentidos; Terminal do Cabral; Terminal do Hauer; Terminal do Portão; Estação UTF-PR, sentido bairro; e Estação Itajubá. Ao todo, observaram um total de 697 trechos percorridos por ônibus, adotando uma metodologia com escalas que poderiam variar dos níveis zero (ônibus vazio) a 5 (ônibus superlotado).
Na auditoria realizada no ano passado a equipe do TCE-PR adotou como parâmetro máximo o nível 3 de lotação, que admite 100% dos passageiros sentados mais 50% da capacidade de passageiros em pé. À época Curitiba adotava a bandeira laranja em relação ao enfrentamento à Covid e o recorde diário de casos foi de 767 e o de mortes, de 28.
No entanto, diante da nova realidade enfrentada pelo município, com 100% dos leitos ocupados, 44 óbitos e 914 novos casos confirmados no último dia 18, considerou-se imprudente manter o mesmo critério de ocupação utilizado por semanas seguidas em que a pandemia estava mais controlada.
Dos 697 trechos observados durante o horário de pico da última sexta-feira, 77 ou 11,04% foram classificados como nível de lotação 3 (100% dos passageiros sentados mais 50% em pé) ou mais, sendo 2,58% enquadrados no nível 4 (entre 71 e 90 passageiros, considerado lotado para os veículos que operam nessas linhas) e nenhum no nível 5 (entre 91 e 110 pessoas, situação que seria classificada como superlotação).
“Ou seja, do total das observações, é possível afirmar que, em 11,04% dos casos observados, os usuários foram expostos a riscos de contágio da Covid-19 acima do recomendável para a atual situação”, escreveram os auditores do Tribunal no Relatório da Inspeção, anexado ao Processo nº 160953/21.
Diante da constatação de que parte considerável dos ônibus ainda circula com número de passageiros acima do limite máximo de 50% e ao fato de que o atual momento sanitário requer cuidados redobrados, a equipe de inspeção recomendou que seja adotada regra de lotação máxima do nível 2 (100% dos assentos ocupados), ao menos enquanto o município de Curitiba estiver em bandeira vermelha.
Embora tenha havido redução do volume de passageiros entre a auditoria de 2020 e a fiscalização executada na última sexta, a conclusão dos técnicos é de que a situação ainda é inadequada para o quadro atual da pandemia.
Colaboração TCE/PR