Pesquisar o que temos de registro nos Anais do Senado Brasileiro sobre o que homens falavam sobre mulheres antes de 1934, ou seja, antes da “conquista do voto feminino” tem sido uma descoberta atrás da outra. Entendo ser fundamental cada vez mais nós mulheres compreendermos o que homens falam sobre mulheres quando não estamos presentes. Principalmente em espaços políticos.
Entre relatarem nos discursos sobre suas relações com esposas, filhas, mães e trabalhadoras sexuais, homens políticos também são historicamente os responsáveis por determinar direitos e deveres das meninas e mulheres nas sociedades.
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O que antes da criação das instituições políticas não era crime ou proibido para as mulheres, depois das instituições, esses espaços além de regular a vida em sociedades, é também o principal espaço de regulação dos corpos femininos.
Nesses espaços ocupados apenas por eles, proibiram mulheres de aprender a ler, regularam os comportamentos aceitos na sociedade, determinaram que tipo de roupa podiam usar, o horário que poderiam ou não transitar nas ruas, com que idade podiam se casar, com quem se casar, que situações poderiam se divorciar, como seria suas vidas se viúvas ficassem, quantos filhos deveriam ter, que situações poderiam abortar, como deveriam se comportar dentro de suas casas, como uma mulher solteira deveria viver, como Mulheres solteiras e com filhos deveriam viver. Dentro dessas lugares de criação de leis, regularam e ainda regulam os castigos que Mulheres recebem caso fujam das regras por eles estipuladas.
Instituições políticas não foram criadas apenas para regulamentar a vida em sociedades, foram e ainda são espaço masculinos de controle feminino.
Tenho dito a alguns anos que o voto feminino não foi uma conquista feminina no Brasil, porque nunca tivemos no país uma lei que expressamente proibisse mulheres de votar. A proibição se deu no nível da construção cultural política em nossa sociedade. Mulheres não conseguiam o alistamento eleitoral, porque as justiças eleitorais, masculinas não faziam o alistamento. Prova simples disso, é que a primeira mulher a conseguir além de alistamento eleitoral, ser candidata e ser eleita prefeita no país foi Alzira Soriano, no Rio Grande do Norte em 1927.
Apenas dizer “Lugar de mulher não é na política” foi suficiente e ainda é para impedir que mulheres entrassem em massa na política . A cultura, por aqui foi mais forte que o poder da lei em outras situações.
Temos discussões entre 1823 até 1934 de projetos de lei tanto para proibir, como projetos propondo regulamentar em lei o sufrágio feminino. E algumas coisas chamam a atenção nessas discussão. A 1° delas é que quando elas aparecem, só aparecem por pressão externa as instituições. Isso mesmo, só discutem Voto Feminino quando mulheres se juntam e juntas se manifestam pelo voto.
A 2° coisa que chama a atenção são os argumentos. Os contrários argumentam desde que a mulher não foi feita por Deus para as funções políticas, até dizer que o voto feminino seria responsável por destruir as famílias. Já os argumentos favoráveis versão em sua maioria sobre atender aos anseios das mulheres que se manifestam.
E é nesse ponto que chamo a atenção. Atender uma solicitação das mulheres que se manifestarão não é a mesma coisa que querer a participação feminina no jogo político. Quando homens senadores e deputados brasileiros argumentam que é necessário conceder o sufrágio as mulheres, também argumentam que é só com a regulamentação do voto que as manifestação femininas/feministas iriam cessar.
“Elas só iram parar depois que conquistarem o voto, tem sido assim na Europa e por toda a América”
E foi esse argumento que venceu. Conceder o voto para que as manifestações de mulheres pelo voto parassem. Uma conquista argumentativa masculina, não uma vitória feminina. O sufrágio se tornou universal. Não foi a participação feminina que se tornou legal, no sentido de “será legal ter mulheres aqui”. Foi no sentido de será legal conceder o voto, porque elas iram parar de se manifestar.
Eles criaram as instituições e continuam dominando elas para e exclusivamente por seus interesses masculinos. Qualquer conquista feminina se dá por pressão de mulheres. Não por vontade deles. As cotas eleitorais não são uma conquista feminina. São também, assim como o voto: 1° fruto de pressão feminina sobre homens políticos; 2° a saída masculina para silenciar as pressões dos movimentos de mulheres por maior participação.
Se de fato homens brasileiro quisessem que mulheres participassem desses espaços, a cota seria nas cadeiras legislativas e não nas candidaturas como é hoje. A cota orçamentaria é também controle. As mulheres ganham até 30% a menos que homens, elas tem menos recursos de forma geral, e a cota orçamentaria também segue o jogo da manutenção masculina, elas ficam com 30% do orçamento do fundo eleitoral. São candidaturas sem recursos financeiros, por interesse masculino.
Além da clara covardia, podemos dizer que o primeiro interesse comum entre eles é não abrirem mão do principal espaço de controle dos corpos e vida feminino. As instituições legislativas. São eles sozinhos que seguem aprovando qualquer lei nesse país.
Eleger mulheres não é apenas um passo importante, é essencial para quebrar a hegemonia masculina sobre nossas vidas. Não podemos mais permitir que sigam nos controlando. Em uma eleição para cargos políticos a guerra ainda é eles contra nós.