Houve um tempo em que “tudo acabava em pizza”, mas hoje tudo vira meme. Como quem se vinga, o brasileiro cai na sedução da chacota e ri de suas próprias desgraças, no que Jô Soares chamava de “o país da piada pronta”. Aí, entrar na internet, e em especial nas redes sociais, é aquilo que o jornalista Sergio Porto, o falecido Stanislaw Ponte Preta, chamava de “adentrar no perigoso terreno da galhofa”. Entre xingamentos de nível abaixo da camada pré-sal, onde nem a Petrobrás consegue ir mais fundo, existem também alguns internautas mais refinados. Para esses, os preços já estão salgados o suficiente, o ódio é amargo demais, e por isso, temperam seus comentários com ironia, açúcar e afeto. Por exemplo, há quem compare a novela da reunião divulgada pelo senador Marcos Do Val (Podemos) ao xadrez. Enquanto os mais agressivos dizem que no tabuleiro ele seria o cavalo, sabe-se lá de qual lugar do Brasil, alguém imediatamente responde que essa peça ele não poderia ser, porque o cavalo só anda “fazendo o L” e esse é o slogan político de Lula. Enfim, nada anormal para os níveis de civilidade, velocidade e humor ácido no Twitter.
Embora a ridicularização possa parecer uma forma de punição, a realidade é que, mais uma vez, surge uma tentativa de golpe de Estado, coisa séria envolvendo pessoas que só parecem pouco inteligentes. E por incrível que pareça, o mais louco na política brasileira acaba sendo o eleitor, que tem como consolação fazer da chacota a sua justiça. Mas mesmo assim, como fica a vida depois que todo mundo para de rir?
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Bola na trave?
Golpes como o da “saidinha de banco” são antigos, mas entre os que caíram na recente novela do “golpe de Estado”, tem gente muito chateada. Mais até que flamenguista que foi até Marrocos e comprou ingresso só para a final do Mundial de Clubes. E como se fosse o Gabigol dizendo ter ficado em terceiro lugar de propósito, em vídeo postado no último dia 8, Marcos Do Val disse ter divulgado intencionalmente várias versões sobre a tal reunião com Bolsonaro e o ex-deputado Daniel Silveira: “o objetivo foi atingido e, claro que fiz essa manipulação de notícias desencontradas, mas aí um dia vocês podem entender”. Finalizou a declaração afirmando que, “com o tempo vocês vão ver o que vai acontecer e vão ficar muito felizes”. É tanta ida e vinda que não seria estranho se a investigação precisasse da ajuda de um árbitro de vídeo, como no futebol: nesse caso, seria Marcos Do Val ou do VAR?
Na realidade, mesmo que o plano de virada nas urnas não desse certo, a ideia seria criar as condições para o desgaste e afastamento do juiz Alexandre De Moraes? Por isso, de alguma forma “o objetivo foi atingido”? No Twitter, o senador ainda declararia estar lutando sozinho contra o sistema, e lamentou: “pena que os brasileiros escolheram me apedrejar, me difamar […]”. O problema é que depois de apresentar diferentes versões sobre o mesmo fato, ainda anunciou que iria renunciar e logo voltou atrás. Aí, é como diz um antigo meme: “amigo, assim fica difícil te defender”. No final da novela, o Supremo Tribunal Federal (STF) deixou a análise do caso para o Conselho de Ética do Senado. Agora, é esperar e ver se acontece alguma coisa com os envolvidos ou se tudo acaba virando apenas mais um causo no folclore de Brasília.
No mais, enquanto o povo ri e enche as redes sociais com os famosos “kkk”, tem muita gente por aí se aproveitando das vantagens da política. Para uns, basta o status do cargo, mas para outros, mil reais significam “1k”, 10 mil são “10k”, que depois podem virar “100k” e por aí vai no país do “kkk”. Porém, de nada adianta a raiva: por mais que a fome seja grande, há coisas que levam tempo, sob a pena de o apressado comer cru. É a melhoria nas atitudes de toda a população que vai definir se o futuro do Brasil será doce. E mesmo que venha a ser, ainda vai tempo, muito estudo e trabalho para que esse sonho fique pronto e seja servido.