O Instituto Avon divulgou recentemente os resultados de uma pesquisa impactante intitulada “Misoginia e Violência contra Mulheres na Internet: Uma Análise dos Fóruns Anônimos”. Este estudo teve como objetivo principal mapear os discursos misóginos e práticas de violência contra mulheres que ocorrem nos chamados “chans”. Os chans, uma abreviação de channels (canais), são espaços anônimos de comunicação, geralmente encontrados na deep web, onde uma das regras primordiais é a proibição da presença de mulheres.
No período de junho de 2021 a junho de 2023, analisou-se impressionantes 9,5 milhões de posts em 10 chans diferentes, bem como em 47 grupos de aplicativos de mensagens. Um dos achados mais alarmantes deste estudo foi a crescente popularidade desses espaços, que servem como palco para discursos e práticas de desqualificação e violência contra mulheres.
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A pesquisa identifica um dos dados mais perturbadores: a frequência de menções a violência. 46% das discussões sobre mulheres em geral e 69% das discussões sobre pornografia incluíram referências à violência, totalizando quase 18 mil comentários relacionados a vazamentos ou pedidos de vazamentos de fotos íntimas.
Nesses fóruns, os participantes retratam as mulheres como meros objetos para satisfação sexual, muitas vezes denominando-as como “depósito” de esperma. Esses espaços proporcionam um senso de anonimato para aqueles que desejam expressar essas visões perturbadoras.
Perfil dos usuários
Em sua maioria jovens entre 20 e 24 anos, que se autodeclaram conservadores e heterossexuais. Esta é a composição típica do perfil de frequentadores destes espaços. Eles frequentemente demonstram dificuldades socioafetivas, sentimentos de fracasso e rejeição, especialmente em relação às mulheres. Além disso, utilizam frequentemente linguagem misógina, racista, xenofóbica (que promove discursos de ódio contra diferentes origens) e incitação à violência. Termos como “churrascar” (uma expressão que significa morrer) e “raid” (que se refere à exposição de intimidades) são comuns em suas conversas.
Na maioria dos fóruns existe uma proibição explícita contra o compartilhamento de conteúdo relacionado à pornografia infantil. Entretanto, há uma alta demanda entre os usuários por conteúdo envolvendo meninas menores de idade. Elas são frequentemente referidas como “novinhas” e “jail bait” (que significa isca de cadeia, em tradução livre). Nos grupos de aplicativos de mensagens monitorados pela pesquisa, 36% deles tinham “vazamento” no título, muitas vezes seguido pelo termo “novinhas”.
O medo como arma
Além disso, durante a interação nos chans, os frequentadores não apenas trocam conteúdo de desqualificação das mulheres, mas também organizam ataques coordenados que envolvem a exposição de intimidades e perseguição moral, tanto no mundo online quanto no mundo offline (o chamado “mundo real”). Em alguns casos, esses ataques reais às vítimas chegam ao extremo de ameaças de morte.
Daniela Grelin, diretora executiva do Instituto Avon, enfatiza a importância de enfrentar esses espaços online, afirmando que “esses dados revelam como a misoginia se manifesta em discursos e práticas nesses espaços cada vez mais populares e acessíveis. É fundamental que as autoridades e a sociedade comecem a regular, fiscalizar e punir os autores desses comportamentos para que a misoginia não seja normalizada”.
Este estudo qualitativo oferece uma visão profunda dos dados coletados pela Timelens, parceira responsável por conduzir essa pesquisa encomendada pelo Instituto Avon. É um chamado à ação para combater a misoginia online e proteger as mulheres contra a violência virtual.