Sintomas são mais complexos do que a popular dualidade entre bem-estar e depressão
Neste sábado, dia 30 de março, é o Dia Mundial do Transtorno Bipolar. A data faz referência ao aniversário do pintor Vincent Van Gogh, diagnosticado com o transtorno de forma póstuma. O dia foi marcado para conscientizar a população sobre a bipolaridade, principalmente com a quebra de estigmas. Este movimento de informação não deve apenas se dedicar em romper preconceitos sociais com os portadores, mas também alertar sobre os sintomas e possíveis diagnósticos. Pode ser menos sobre apontar como lidar com o outro, e mais sobre a busca de autoconhecimento para entender sintomas.
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Segundo a Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA), a bipolaridade é uma das principais causas de redução do tempo de vida na população entre 15 e 44 anos. Um risco, é a falta de diagnóstico correto. A associação indica que podem ocorrer, em média, três diagnósticos equivocados antes do correto, de bipolaridade. A análise superficial destes dados em convergência pode sinalizar que, se o risco de morte para portadores, já diagnosticados, é alto, o risco diante da falta de diagnóstico é evidente.
Conhecido popularmente por ter uma dualidade entre depressão e euforia, caracterizar o transtorno não é tão simples. Com muitas especificidades e sintomas ambíguos, profissionais da psicologia relatam que o diagnóstico pode demorar anos, mesmo a partir de acompanhamento psicológico e psiquiátrico.
Um exemplo é o caso da própria psicóloga entrevistada pela matéria, que prefere não se identificar: formada há quase 40 anos, descobriu o diagnóstico de bipolaridade com quase 60 anos de idade. Ela informa que as fases dúbias do transtorno não são definidas e óbvias como uma lista de sintomas pode indicar. “A fase de euforia, por exemplo, pode se manifestar como ansiedade. A pessoa, assim, não tem transtorno de ansiedade, mas manifesta uma fase da bipolaridade”, explica. Esse é um exemplo da dificuldade de estabelecer diagnóstico.
A profissional alerta para outra especificidade do transtorno: o suicídio na fase eufórica. O ato de tirar a própria vida é muito associado à fase depressiva, por conta das características da depressão. Já na euforia, são mencionados sintomas como: sensação de extremo bem-estar; aumento da energia; desinibição; impulsividade; ideias de grandiosidade e sensação de “poder”.
Encontra-se, aqui, uma problemática da associação generalista do transtorno como uma variação entre “triste” e “feliz”. A entrevistada fala sobre a possibilidade de acidentes nesta fase em que há ideias de grandiosidade e sensação de “poder”. O portador pode ter a sensação de invencibilidade, colocando a si e pessoas próximas em risco ao “perder o medo” em determinadas situações.
O transtorno na cultura
Exemplo de ideias de grandiosidade são cenas do filme Mr. Jones. O protagonista, diagnosticado com o transtorno bipolar e negligente com a medicação indicada, tem uma fixação com a ideia de voar. Ao se aproximar das beiras de telhados ou prédios, ele reflete sobre a possibilidade de pular. Enfim, em determinada cena, ao acreditar ser capaz de voar, sofre um grave acidente.
O filme também demonstra outro sintoma da euforia, que é a falta de atenção, o que o coloca em risco em um local alto e sem a proteção adequada. Entretanto, a sensação de invencibilidade e euforia são sintomas, vistos pelo protagonista, como positivos. Por isso, opta por negligenciar a medicação, em busca desses sentimentos. Além do filme em geral retratar a complexidade do transtorno, a crença na capacidade de voar é uma característica do protagonista que demonstra os riscos da fase eufórica, muitas vezes entendida como uma fase feliz em detrimento da fase triste, depressiva.
Outro exemplo mais atual é da personagem de Anne Hathaway na série Modern Love. O episódio mostra, em poucos minutos, a dificuldade da personagem em conviver com o transtorno, mesmo tendo conhecimento dele e sendo medicada. A medicação, entretanto, ainda não é ideal, pois esse também é um processo demorado. O transtorno é retratado de forma diferente em ambas produções, (Mr. Jones e Modern Love), o que ressalta-se ser um exemplo de como cada caso de portador é específico.
Em Mr. Jones, a alteração de humor é mais lenta do que é demonstrado pela personagem da série. As fases, da euforia ou depressão, podem durar dias, meses, ou até anos. São muitos fatores que influenciam no transtorno e em sua forma de manifestar: tipo do transtorno (1,2 ou 3), idade, influência genética, se aparece junto de outros transtornos emocionais ou de personalidade, influência social, “gatilhos”, entre outros. Essas duas referências de personagens bipolares são um meio propício para entendimento das nuances do transtorno.

Foto: Filme Mr. Jones
O transtorno bipolar, portanto, merece uma data de conscientização para que se torne mais conhecido e haja maior dedicação na busca por um diagnóstico. Saber sobre a bipolaridade pode trazer maior qualidade de vida a partir do tratamento com profissionais e, se necessário, medicação adequada.
A população pode recorrer aos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), ambulatórios de saúde mental, além das Unidades Básicas de Saúde. Todos oferecem serviços de auxílio. O Centro de Valorização da Vida (CVV) também pode ser acessado através do site ou de ligação com os voluntários.