O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou o julgamento que analisa a constitucionalidade da divulgação dos nomes de devedores contumazes de ICMS, em processo originado no Rio Grande do Sul. O caso, que tramita em Brasília e mobiliza juristas, empresários e governos estaduais, coloca em confronto dois pilares centrais: a defesa da concorrência leal e a preservação das garantias constitucionais.
A norma questionada autoriza a inclusão de informações sobre devedores contumazes em cadastros públicos e até mesmo em notas fiscais eletrônicas. O objetivo declarado é combater a inadimplência reiterada de contribuintes que, segundo os defensores da medida, obtêm vantagem competitiva indevida ao deixar de recolher o tributo. Por outro lado, críticos apontam que a legislação cria barreiras indiretas ao exercício da atividade econômica, configurando possível sanção política.
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Para Angel Ardanaz, advogado da Ardanaz Sociedade de Advogados e professor de Direito Empresarial e Tributário, o julgamento tem alcance que ultrapassa a técnica tributária. “Estamos diante de um caso que envolve, ao mesmo tempo, direito, economia e relações de mercado. A decisão do Supremo terá reflexos que vão muito além da esfera fiscal, alcançando a dinâmica concorrencial e a reputação das empresas envolvidas”, afirma o advogado tributarista.
A defesa do Estado do Rio Grande do Sul sustenta que a medida é direcionada a um grupo restrito, que representa apenas 0,5% dos inadimplentes, e que se enquadra no conceito de devedor contumaz. O argumento é de que se trata de instrumento excepcional, voltado a situações extremas em que há inadimplência sistemática e reiterada.
Do outro lado, a ação apresentada questiona os limites da norma. Os advogados responsáveis sustentam que a divulgação em documentos fiscais e a exposição pública da condição de inadimplente afetam diretamente a liberdade de comércio e de trabalho. Para os críticos, há risco de que o mecanismo se torne uma forma indireta de coerção, ainda que não configure formalmente interdição de atividades.
O voto do relator no STF validou a norma, destacando que a inadimplência reiterada gera impactos não apenas fiscais, mas também concorrenciais. Empresas que deixam de recolher o ICMS reduzem custos artificialmente, desequilibrando o mercado. Esse ponto atraiu a atenção de diferentes setores econômicos e de outras unidades federativas, que ingressaram no processo como partes interessadas.
Segundo Angel Ardanaz, o aspecto mais sensível está em distinguir medidas legítimas de fiscalização de sanções indiretas. “O Supremo já afastou práticas como a apreensão de mercadorias e a interdição de estabelecimentos, reconhecendo seu caráter punitivo. No caso atual, a dificuldade é avaliar se a divulgação pública se enquadra como instrumento de transparência ou como barreira desproporcional à atividade econômica”, analisa.
Além do Rio Grande do Sul, outros estados brasileiros já adotam mecanismos semelhantes para lidar com o devedor contumaz, como a exigência de pagamento antecipado do imposto ou a transferência de responsabilidade ao fornecedor. No Congresso Nacional, tramita projeto de lei complementar que busca unificar critérios, reforçando a tendência de consolidação de regras específicas para o tema em âmbito nacional.
O impacto da classificação como devedor contumaz vai além das disputas judiciais. A inclusão de observações em notas fiscais pode restringir relações comerciais, afastando fornecedores e clientes. Além disso, há reflexos sobre regimes especiais de pagamento, acesso a créditos fiscais e custos operacionais adicionais para as empresas.
Nesse cenário, a recomendação é que companhias adotem práticas preventivas de planejamento tributário. “Mais do que nunca, as empresas precisam estar atentas ao cumprimento das normas fiscais e à adoção de estratégias jurídicas que reduzam riscos. O acompanhamento especializado permite antecipar litígios e evitar que questões tributárias comprometam a continuidade dos negócios”, orienta Angel Ardanaz.