
A batalha pela Warner Bros se transformou no confronto mais simbólico — e decisivo — da indústria global do entretenimento em 2025. Não se trata apenas de quem coloca mais bilhões na mesa, mas de dois projetos antagônicos para o futuro de Hollywood. De um lado, a Netflix, gigante já consolidada do streaming. Do outro, a Paramount revitalizada pelos Ellison, agora com ambições de gigante. No centro dessa disputa, uma questão crucial: o que Hollywood quer ser daqui para frente?
O imbróglio começou em 5 de dezembro, quando a Netflix anunciou a compra da maior parte da Warner Bros Discovery por US$ 83 bilhões, misturando dinheiro vivo e ações. Três dias depois, a Paramount lançou uma ofensiva inesperada: uma oferta hostil de US$ 108 bilhões pelo controle total do grupo. A mensagem foi cristalina: “Nós pagamos mais. E enxergamos uma Warner diferente da que a Netflix quer.”
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Esse choque de visões é o cerne da história.
A estratégia da Paramount: ressuscitar o velho Hollywood com dinheiro novo
A Paramount, agora sob o comando do produtor David Ellison, entrou no jogo com um discurso claro: escala, cinema e tradição.
A lógica é simples: sozinha, a Paramount não tem fôlego para competir com Netflix, Disney e Amazon. Mas fundida à Warner, criaria um novo “superestúdio” capaz de recolocar o cinema na linha de frente.
Ellison promete 30 filmes por ano nas salas, uma espécie de renascimento hollywoodiano financiado não apenas por capital americano, mas também por fundos soberanos do Golfo — Arábia Saudita, Catar e Emirados Árabes Unidos — que se dispõem a aportar US$ 24 bilhões no negócio. O movimento, porém, acende alertas em Washington: um dos maiores conglomerados de mídia dos EUA — que controlaria inclusive CNN e CBS — teria parte relevante de seu capital vindo de monarquias estrangeiras e de um consórcio com participação indireta do círculo de Donald Trump, via Jared Kushner.
Politicamente, a Paramount aposta que seu acordo passaria mais fácil pelos reguladores. Mas a presença de capital do Golfo cria um flanco sensível e inevitável.
A aposta da Netflix: menos estúdios, mais propriedade intelectual premium
A Netflix, por sua vez, não quer tamanho — quer poder de fogo intelectual.
A líder do streaming, com 325 milhões de assinantes, já domina a escala. O que ela não domina é o conteúdo de alto prestígio. Seus números revelam a lacuna: tem o dobro de títulos da Warner nos EUA, mas fica atrás em obras com nota 9 ou mais no IMDb. É a HBO — com séries como Game of Thrones, Succession e The Last of Us — que carrega o selo de excelência que a Netflix ainda tenta alcançar.
Para a empresa, comprar a Warner é adquirir a matéria-prima mais valiosa da indústria: propriedade intelectual premium.
É aí que o negócio muda de patamar. A Netflix não quer apenas vencer a disputa com Disney e Paramount. Segundo seus executivos, seu maior rival hoje se chama YouTube — que abocanhou 28% de toda a audiência de streaming em TVs nos EUA, contra 19% da própria Netflix.
Em outras palavras: a Netflix quer a Warner para brigar com o algoritmo do Google, não com Hollywood.
O que está em jogo: o modelo de entretenimento que prevalece
A disputa por Warner Bros não é apenas uma guerra de ofertas. É um duelo filosófico entre duas ideias de futuro:
1. O “reboot nostálgico” da Paramount
- Reforçar salas de cinema.
- Manter estúdios tradicionais funcionando como no século XX.
- Reacender guerras do streaming com um novo megaestúdio.
- Financiar a operação com capital árabe e alinhamento político com a Casa Branca.
2. O “salto definitivo” da Netflix
- Reduzir o número de estúdios independentes.
- Absorver a Warner para maximizar IPs globais.
- Competir diretamente com plataformas sociais como YouTube e TikTok.
- Apoiar-se em audiência já consolidada para escalar globalmente franquias premium.
Os acionistas da Warner precisam decidir se querem um resgate da Hollywood clássica ou um avanço agressivo para o futuro das telas.
A equação regulatória: quem tem mais chance?
Os dois caminhos são politicamente complexos.
- Donald Trump já afirmou que a compra da Warner pela Netflix “pode ser um problema”, citando o tamanho da empresa.
- Ted Sarandos, da Netflix, é historicamente ligado ao Partido Democrata — algo que pesa em um Washington extremamente polarizado.
- A Paramount, embora alinhada politicamente com Trump, traz fundos do Golfo para dentro de um conglomerado de mídia americano — o que inevitavelmente atrai o radar do órgão de segurança nacional CFIUS.
Resultado: nenhum acordo está garantido.
Impacto no mercado: streaming, cinema e a guerra pela atenção
Independentemente de quem vença, o resultado mudará o entretenimento global:
- Se a Paramount levar: Hollywood ganha um “superestúdio” com força para reviver bilheterias e reaquecer salas de cinema.
- Se a Netflix vencer: o setor se consolida ainda mais em torno de um único gigante digital, e IPs como Harry Potter, DC e Game of Thrones podem virar expansões multiplataforma à la Stranger Things.
Em ambos os cenários, quem perde autonomia são os estúdios médios e pequenos — cada vez mais espremidos na guerra pela atenção, que hoje envolve desde Barbie até vídeos de 30 segundos no TikTok.
Hollywood escolhe entre passado e futuro
A oferta bilionária pela Warner Bros é mais que uma disputa corporativa. É um plebiscito sobre o que será a indústria do entretenimento na próxima década.
A Paramount oferece continuidade — uma Hollywood reconhecível, polida, cinematográfica.
A Netflix oferece disrupção — menos estúdios, mais dados, IPs globalizados e um duelo direto com plataformas digitais.
Para a Warner, resta uma decisão incômoda: apostar na nostalgia ou abraçar o algoritmo.
