A promulgação da Reforma Tributária (Emenda Constitucional nº 132/2023) trouxe um misto de alívio e apreensão para as mais de 800 mil organizações da sociedade civil no Brasil. Embora o texto constitucional tenha preservado a imunidade tributária para entidades beneficentes, o futuro do setor depende agora da regulamentação por meio de leis complementares, cujo debate está em andamento no Congresso Nacional. Especialistas alertam que as novas regras podem tanto simplificar e fortalecer a atuação do setor quanto criar barreiras operacionais e financeiras.
Segundo o advogado Tomáz de Aquino Resende, a principal mudança da reforma é a unificação de tributos sobre o consumo no novo sistema, composto pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de âmbito federal, e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência de estados e municípios. A grande questão para o terceiro setor é como a imunidade será aplicada na prática dentro dessa nova lógica.
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“A garantia da imunidade na Constituição foi uma vitória fundamental, fruto de uma intensa mobilização do setor. No entanto, o jogo ainda não terminou”, afirma o advogado. “O verdadeiro impacto da reforma será definido na letra miúda das leis complementares. É nesse detalhamento que residem as oportunidades e os riscos”, completa.
Entre os principais pontos de atenção que serão definidos na regulamentação, destacam-se:
- Tributação sobre o consumo: como a imunidade se aplicará às compras de bens e serviços pelas entidades? Haverá isenção direta na ponta, um sistema de devolução de impostos (cashback) ou a necessidade de aproveitamento de créditos? A complexidade deste mecanismo pode impactar diretamente o fluxo de caixa das organizações;
- Critérios para imunidade: as leis complementares poderão estabelecer ou redefinir os requisitos para que uma entidade seja considerada beneficente e, portanto, apta a usufruir da imunidade. Regras mais rígidas ou burocráticas podem dificultar o acesso ao benefício, especialmente para organizações menores;
- Regimes específicos: a criação de regimes tributários específicos e simplificados para as entidades sem fins lucrativos é uma das grandes expectativas. Um modelo adequado poderia reduzir a burocracia e os custos de conformidade, permitindo que mais recursos sejam destinados à atividade-fim;
- Burocracia e obrigações: a transição para o novo sistema exigirá a adaptação a novas declarações e procedimentos fiscais. A complexidade dessas obrigações pode representar um ônus administrativo e financeiro significativo, desviando recursos que deveriam ser aplicados em projetos sociais, ambientais e culturais.
“O momento é de diálogo e vigilância. É crucial que o Congresso Nacional e o Governo Federal ouçam as particularidades do terceiro setor ao desenhar a regulamentação. Um sistema que não reconheça a importância e as especificidades das Organizações pode, na prática, anular o benefício da imunidade ao sobrecarregá-las com custos e burocracia. Defendemos regras claras, simples e que fortaleçam a capacidade de atuação da sociedade civil”, enfatiza.
“As organizações do setor acompanham atentamente as discussões dos grupos de trabalho do governo e a tramitação dos projetos de lei complementar, buscando garantir que a reforma se traduza em um avanço real para o ambiente de negócios sociais no país”, conclui Tomáz de Aquino Resende.